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segunda-feira, 23 de maio de 2011

PESQUISA = TEATRO DE NOVIDADE?

Luis Alberto Alonso em A Ponte dos Ventos/Dinamarca
Por. Luis Alberto Alonso.
Oco Teatro Laboratório.

Está surgindo uma nova tendência teatral em Salvador, dedicada ou direcionada precisamente ao trabalho de grupo. Olhar para este fenômeno e direcionar esse olhar com curiosidade e delicadeza é no mínimo um gesto de humildade que os criadores mais conservadores -uso esta terminologia para poder focalizar esses realizadores, mas sem nenhuma pretensão de uso pejorativo- deveriam se deter a contemplar, pois nesses impulsos mais contemporâneos podem existir caminhos a serem trilhados para um rejuvenescimento do teatro que vivenciamos ainda hoje na capital soteropolitana.
Por outra parte, nós, grupos de pesquisa devemos ter um pouco de perspicácia de não querer transformar em novidade aquilo que de novo não tem nada. Quando decidimos encaminhar uma pesquisa devemos pensar o  quê de novo podemos alcançar que não resulte reiterativo, assim como viajar por esse universo do pesquisador sobretudo com ética e um mínimo de experiência que não nos faça esbarrar no pecado de nos apropriar de terminologias ou elementos já criados pretendendo divulgar como nossos.
Eugênio Barba para designar o que é pré-expressividade levou muitos anos em trabalho coletivo não somente com o Odin Teatret, mas também com os encontros organizados para tal finalidade nas chamadas ISTAs (International School of Theater Anthropology), Bob Wilson já existe no nosso meio faz muitos anos, Tadeusz Kantor quebrou como nenhum outro a visão da cena como um todo, dando um novo valor ao conceito de texto e arquitetônica teatral. Os movimentos de contra-cultura surgiram em Europa nos anos 60, em São Paulo nos anos 70 e assim por diante temos várias dúzias de exemplos a serem tratados, cada um na sua individualidade. Não quero dizer com isto que as ações de investigação teatral voltadas para esta área estejam esgotadas, o que pretendo esclarecer é que é necessário descobrir novos espaços de pesquisa para não ficar ancorados em discursos já trilhados e para tanto isso merece muitos anos na ação, quase em claustro, de beber das fontes já existentes. Muita paciência e não nos deixar levar pela presa da sociedade contemporânea que nos faz cometer o erro de querer mostrar que existimos e na maioria dos casos tudo fica a medias, sem uma pesquisa sólida e de anos de trabalho, aí vem o descrédito que muitos criadores tem com o teatro de pesquisa.  Por outro lado penso que eu somente posso estar decidido a passar um conhecimento quando eu tenho total certeza de que esse conhecimento está sentado sobre bases de pesquisas sólidas, não sobre apropriações instantâneas (faço uso de instantâneas fazendo um recorte de tempo, quero dizer curto tempo, colocando esse vivenciar instantâneo como algo que merece muitos anos de pesquisa). Não pretendamos ser inovadores com tudo aquilo que já está inovado, vamos inovar mesmo!.
Entendo também que cada processo histórico pertence àquela comunidade em transformação e por esta razão o movimento de teatro de pesquisa na Bahia não deve achar que está defasado ou fora do eixo. Sempre existirá um movimento de renovação não somente nas artes, mas em qualquer área de conhecimento e produção do ser humano, mas na atualidade através dos meios de comunicação e o desenvolvimento da informática, focalizando a internet como o seu melhor expoente, percebemos que a humanidade não se limita a espaços delimitados geográficamente, mas que é uma junção de todas essas comunidades como um todo. Então, como grande paradoxo à minha questão anterior  me apresenta uma nova pergunta: estamos realmente defasados no que se refere a bases de estudo nos grupos de pesquisa?  
Por outro lado, retomando a questão ética  na hora da pesquisa, para citar um exemplo de apropriação desvirtuada de um treinamento que levou anos para se concretizar como um exercício importante dentro do trabalho do ator, vou me referir à Dança dos Ventos, dança ritmada de passo ternário que foi criada e desenvolvida no grupo internacional Ponte dos Ventos (é daí que surge o nome de Dança dos Ventos), dirigido por Iben Nagel Rasmussen, atriz do Odin Teatret, grupo que integram entre outros atores e pesquisadores internacionais, criadores brasileiros como Carlos Simioni (Lume Teatro-SP), Rafael Magalhães (Oco Teatro-BA) e Tatiana Cardoso (Universidade de Rio Grande do Sul) e do qual faço parte como membro permanente desde o ano 2005. Este treinamento tem sido pulverizado por várias partes do mundo, entre eles, pelos próprios criadores brasileiros que viajamos e ministramos cursos em várias universidades e grupos de pesquisa. O jeitinho, que não é somente brasileiro, faz com que as pessoas em cinco dias de curso se apropriem da dança, nada contra isso, mas uma vez se apropriando não dão uma continuidade com seriedade e no pior dos casos transformam a dança em algo aparentemente de novidade para depois pulverizar em novos encontros para outros grupos, dando o mesmo nome da dança que eles aprenderam nos seus inícios. Tenho sido fiel defensor desta política ética de cuidar daquilo que tem uma origem ainda viva, pois é nessa origem onde está o cerne e a força desse treinamento.
O que é gerado no trabalho do ator a partir da ação física e o que isto gera na  andaime teatral como um todo começou entre outros com Meyerhold (1874-1940) e Craig (1872-1966), e até hoje está sendo absorvido de uma maneira muito orgânica até pelo mesmo teatro que chamamos de convencional, este último talvez na procura de um teatro realista mais contemporâneo, me atreveria a dizer que o trabalho do ator a partir das ações físicas está entrando no terreno que podemos denominar de Fisiologia do Teatro. Então, o quê de novidade há nisto? Sou fiel observador destes princípios que chamamos renovadores, para tentar evitar aparentes descobrimentos na arte teatral em Salvador.
Quero lançar assim um abraço a todos os grupos de pesquisa de Salvador, sobretudo àqueles que partem da mesma escola canônica que nos cerca. Eles são um grande movimento para desnortear a visão daqueles que aprisionam a arte em sistemas quadrados pré-estabelecidos, sem chance para novas estruturas. Ainda que em movimentos muito jovens e incipientes são pequenas faíscas que aos poucos provocarão o incêndio que nos levará a Queimar a Casa[1].

[1] Referência ao nome da última produção teórica de Eugênio Barba.

Um comentário:

  1. Se tudo evolui, Dea, acho que nas artes esta necessidade é ainda mais premente. :) Boa semana!

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